O futebol une. O futebol separa. Em terra e no mar. É certo que os 34 elementos da tripulação do “N.R.P. Almirante Gago Coutinho”, envolvidos naquela que é a maior expedição científica portuguesa de sempre, sabiam que tinham de ver o primeiro jogo da selecção portuguesa a bordo do navio, mas também é verdade que não faziam ideia que a sorte (ou será melhor dizer o azar?) acabaria por lhes dar a oportunidade de assistir ao jogo sem cortes de imagem na "hora H".
O navio hidro-oceanográfico da Marinha devia estar ao largo das Selvagens no dia em que Portugal devia ter ganho. Mas o navio estava, afinal, atracado no porto do Funchal. E Portugal não foi além de um empate.
A avaria de uma peça do robot submarino, a menina dos olhos da missão que começou há uma semana, obrigou os cientistas que operam o veículo capaz de mergulhar às profundezas do oceano e os que tratam as amostras que o ROV trás para a superfície, obrigou-os a todos a regressar à Madeira. Enquanto a peça não vier, o ROV não está pronto para voltar a maravilhar investigadores e marinheiros. E sem o ROV a funcionar a 100 por cento não vale a pena voltar a enfrentar o Atlântico rumo às Selvagens.
Serviu este contratempo para sentar os marinheiros em frente às três televisões que há a bordo do “Gago Coutinho”. Numa sala os praças. Na outra os sargentos. E na outra ainda os oficiais e o comandante vestido a rigor. O sinal de satélite é bom, o que nem sempre acontece em alto mar. O momento é de esperança. O jogo começa. A bola rola no relvado e as lapas e os camarões deslizam da cozinha para as mesas.
Os que assistem ao jogo neste navio torcem pelo mesmo lado, mas qualquer treinador de sofá que se preze tem de defender as cores do seu clube até mesmo quando só importa que o verde e o encarnado juntos levem a taça.
E, em momentos como este, somos todos pelo verde e encarnado. Ou melhor, há uns que mesmo quando joga a selecção gostam mais de ver a cor verde e outros mais a encarnada. E isso, claro, reflecte-se nas constantes, rápidas e seguras análises das jogadas. Sobretudo se o responsável pela missão às Selvagens gostar mais do Benfica e o comandante do navio defender mais o Sporting. Para um o “Fábio Coentrão é o melhor defesa do Mundial”, para o outro o Levezinho é que salva as jogadas. Diferentes pontos de vista que a desilusão do empate acaba por esbater. Pelo menos até ao próximo jogo de Portugal que obrigará, ainda mais, cientistas e marinheiros a unir energias desde o ponto mais a sul do país até ao país mais a sul do continente africano. E que a digestão dos crustáceos e dos resultados da bola continuem a não precisar de “Compensan”.
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